sexta-feira, 8 de março de 2013

Poderia falar do "feliz dia da mulher"


Num dia de verão, pleno de calor eram 17h quando o meu telefone toca no meu trabalho e, qual não é o meu espanto quando oiço a voz de uma amiga a chorar quase desesperada. Desesperada pensava eu que fosse pelo facto de estar naquela situação, mas enganei-me.
Fui ter com ela o mais depressa possível assim que saí do trabalho e fui encontrá-la a tremer que nem varas verdes e ainda longe da casa dela, pois o carro do namorado estava lá à porta. Fui com ela a casa, trouxe roupa e rumámos para casa de outra amiga para poder tomar banho e descansar um pouco.
Ela tinha a t-shirt rasgada, com sangue, as pernas e os braços com nódoas negras, o cabelo despenteado e chorava....
Tinham ido almoçar à praia com os pais dele, era o aniversario dele e ele já estava bem alegre. Depois beberam, beberam demais...a meio da tarde a caminho do estacionamento para se dirigirem ao carro dela, ele "virou a boneca" começou a bater-lhe, ali naquela rua estreita, aparentemente por ciumes e bêbedo que nem um casco. Ela implorava para que ele parasse, ele atirou-lhe com os chinelos, ela fugiu para dentro do carro, e ele pôs-se à frente para ela não arrancar...ela amava-o...ele obrigou-a a sair do carro, puxou-lhe pelos cabelos, ela empurrou-o para se conseguir livrar dele e assim ele caiu no chão. Coitado, pensou ela. Correu para o ajudar a levantar-se...ela amava-o...quando ele se levantou os olhos estavam quase na testa e esbranquiçados de tanta raiva, tinha uma força de leão e bateu-lhe de novo e pontapeou-a...momentos curtos que pareceram uma eternidade.
Numa rua vazia de movimento, mas transversal à marginal eis-que passa alguém conhecido e correm a chamar a família dele que continuava na esplanada...outra eternidade...mas nesse mesmo instante eis que quase por milagre (ou isto, ou alguém num prédio em frente viu e chamou, mas não se meteu) chega um carro da policia. Ela chorava, pobre coitado, já tinha caído de novo e estava quase em coma alcoólica, descalço, coitado dizia ela...
A policia perguntou se ela queria apresentar queixa, ela disse que não...ela amava-o...e eles nada fizeram, mandaram-na para casa, os familiares chegaram entretanto e levaram o bêbedo para casa onde dormiu o resto da tarde. A policia nada fez, não o levou para a esquadra, não lhe deu um excerto de porrada por bater em mulheres, ninguém fez queixa e ela implorou para que nós amigas não fizéssemos queixa, as filhas dela não podiam saber, a mãe não podia saber...e ela amava-o...
Os dias passaram, as nódoas negras continuaram, a roupa foi para o lixo, ela perdoou, ela levou porrada de novo...a mãe descobriu e tirou-lhe as filhas...ela sofria mas amava-o...
Numa noite de outra revolta, vésperas de um fim-de-semana longe de tudo e de todos no Algarve já previamente combinado, ele lá estava com os olhos na testa, enraivecido, bêbedo, violento. Eu estava revoltada, implorei para que ela entrasse no meu carro...ela não quis, preferiu ir com ele e levou porrada de novo...e no dia a seguir, arrependida foi lá ter de autocarro, lavada em lágrimas e nódoas negras. No entanto já andavam inclusive a procurar casa para morarem, porque quando ele estava sóbrio era um amor de pessoa e era a "loucura"...a loucura que ela amava...mesmo já sem as filhas elas estava disposta a ficar com ele e a ser (in)feliz.
Graças a um ser superior algures, fez-se luz naquela cabeça e um dia ele chega a casa dela e nem a cumprimenta, ela desatinou e mandou-o embora...aleluia...ele foi e nunca mais voltou. As nódoas negras continuaram durante muito tempo e o sentimento também...ela amava-o...raios partam a este amor estúpido e louco de adrenalina e de quanto-mais-me-bates-mais-eu-gosto-de-ti.
Felizmente, hoje em dia já passou, eu presenciei uma amiga nesta situação e espero nunca mais vê-la assim, espero que ele não lhe apareça mais à frente, porque sei que ela ainda sente...




14 comentários:

  1. Apesar de triste, esta história teve um final feliz.

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  2. Não conheço nenhuma história assim, felizmente.
    Mas quando o meu ex começou a querer mandar em mim, eu pus um ponto final na relação. (ele fez-me a vida num inferno depois, mas isso é outra história...)

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    1. Desses homens é distância...nem que seja através da justiça.

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  3. Meu deus, fiquei arrepiada. Espero mesmo que ela tenha mandado o sacana dar uma volta.

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  4. Que história tão triste, mas apesar de tudo com um final feliz.

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    1. Sim e foi com ela que comemorei o "feliz dia das mulheres"!

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  5. Nunca conheci ninguém que tivesse passado por esse terror, mas sempre me indaguei o porquê de as mulheres aceitarem, perdoarem. É preciso sentir um grande amor, um que não se desvaneça perante tal brutalidade. :-/

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  6. Obrigada pelo testemunho...estes relatos da vida real fazem-nos pensar...pensar muito!
    Bjs

    Maria

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  7. Pois é Sónica, eu também por isto tudo, não igual mas muito parecido com uma amiga, só muda um pormenor entre outro, só muda o número da porta, só muda os finais, que às vezes são ainda mais infelizes.

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    1. Violência doméstica...amor danado...nós amigas ficamos caladas mas não devíamos...

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